O Brasil está na iminência de um
vergonhoso retorno ao mapa da fome da ONU (Organização das Nações Unidas), de
onde tinha saído em 2014. Com a entrada do governo golpista de Michel Temer, a
partir de 2016, os investimentos sociais deixaram de ser prioridade e o corte
em programas como o Bolsa Família ou o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA)
afetou diretamente famílias como a da mineira Maria Joana.
Joana tem 64 anos e há 17 mora às
margens da BR 458, no entorno do colar metropolitano do Vale do Aço (MG).
Natural de Bom Jesus do Galho (MG), viúva do primeiro marido e deixada pelo
segundo, é ela quem gerencia o pequeno barraco onde mora com seu filho de 25
anos e o neto Claiton de 12 anos. Três pessoas e a única renda fixa vem do
benefício de R$ 171 do Bolsa Família.
“Com todo o peso do mundo em suas
costas”, Joana é de riso fácil. Cheguei cedo e só ela estava acordada e ativa.
Tinha feito café, buscado um pouco de água na cisterna e cuidava da criação.
Muito curioso, Claiton levantou com a minha chegada, veio sem escovar os dentes
mesmo e me ofereceu uma mexerica. Arredio, o filho de Joana não me olhou nos
olhos, não cumprimentou e eu o deixei a vontade na sua particularidade.
Atenciosa, Joana começa a
compartilhar sua história de vida. Fala com carinho dos tapetes que costura,
conta com orgulho a sua luta e da decisão de tentar melhores condições ao
ocupar um pedacinho de terra para subsistência. Isso porque com o rendimento
não conseguia mais pagar o aluguel, fazer compras, pagar passagens, comprar
roupas.
Mineiro tem fama de desconfiado.
O filho de Joana é a expressão viva desse esterótipo. “Quando saí da cadeia,
fiquei dois anos e meio longe do crime. Um dia minha mãe passou mal, eu não
tinha dinheiro para um mototaxi para levá-la ao hospital”. Foi o chamado para
voltar ao tráfico e tentar uma renda a mais na casa.
Joana não aprova as escolhas do
filho, mas acolhe e sabe dos riscos e das consequências deste caminho. Para
ele, a falta de oportunidades foram o levando para esse caminho. “A televisão
mostra altos financiamentos e eu moro em um lugar que não tem nem reboco. Eles
me ilude (sic) a ter uma coisa que não posso e depois me oprime (sic) porque eu
corro atrás daquilo”. Ele acha que as consequências tem que ser cobradas, “mas
nem todo mundo faz porque quer. As vezes o
filho de quem julga tá bem, mas porque teve uma escola.”
No final dos anos 80, a década
perdida, Jorge Furtado apresentou famílias que sobreviviam do resto de feira no
documentário “Ilha das Flores”. Em 2018, com um país dominado pelo agronegócio
e pela ditadura da estética, o desperdício atinge até mesmo frutas, legumes e
hortaliças “feias”, que por não estarem vistosas, são descartadas ao lixo. Foi
nesse lixo que Joana achou alface no meio do monte de legumes trazidos na
carroceria do caminhão por Onofre. Ela sorriu timidamente e, de maneira
assertiva, disse que só precisava lavar e colocar um pouco de cloro para
limpar. “Pra gente sobreviver, a gente tem que ter coragem”.
A família de Joana busca estar um
degrau acima da miséria. Falta fair play com o povo brasileiro.
Nenhum comentário:
Postar um comentário