quarta-feira, 3 de agosto de 2016

A agressão à Letícia Sabatella atinge a democracia pelas costas





Por Leonardo Isaac Yarochewsky
Advogado Criminalista e Professor de Direito Penal da PUC-Minas

Na noite deste domingo, 31 de julho, a atriz curitibana Letícia Sabatella foi ofendida e agredida em Curitiba. Não, não é um capítulo de novela, também não é um filme ou uma peça de teatro. É a realidade nua e crua. É o autoritarismo e o fascismo assaltando a democracia. O ataque à Letícia é uma afronta a todos nós, nós que defendemos a democracia, a legalidade, os direitos fundamentais, as garantias constitucionais e o Estado democrático de direito.
Com bem observou Nasser Allan, advogado da atriz, Letícia foi vítima da intolerância e do ódio. A atriz Letícia Sabatella, que se manifestou publicamente contra o impeachment da Presidenta da República Dilma Rousseff, foi ofendida com palavras de baixo calão, além de ser constrangida quando passava próximo aos manifestantes em favor do impedimento de Dilma e em apoio a Operação Lava Jato, conduzida pelo juiz Federal de Curitiba Sérgio Moro.
 Lamentavelmente, não tem sido raro pessoas serem agredidas e ofendidas em nome do ódio e da intolerância que alimentam o fascismo. Políticos, artistas e todos que estão comprometidos com a defesa da legalidade democrática e contrários ao golpe parlamentar, independente de partidos políticos, estão sujeitos aos ataques daqueles que não sabem conviver com as diferenças e a democracia.
 Como bem disse Rubens Casara - na apresentação do livro da filósofa Márcia Tiburi - “o fascismo possui inegavelmente uma ideologia de negação. Nega-se tudo (as diferenças, as qualidades dos opositores, as conquistas históricas, a luta de classe etc.), principalmente, o conhecimento e, em consequência, o diálogo capaz de superar a ausência do saber. O fascismo é cinza e monótono, enquanto a democracia é multicolorida e em constante movimento. A ideologia fascista, porém, deve ser levada a sério, pois, além de nublar a percepção da realidade, produz efeitos concretos contrários ao projeto constitucional de vida digna para todos”.
A sociedade precisa entender que o ataque do último domingo à cidadã Letícia Sabatella atinge a neófita democracia brasileira. Democracia que tem como objetivo a libertação dos indivíduos das coações do autoritarismo. Democracia material que busca excluir, eliminando definitivamente, as desigualdades econômicas e sociais. A democracia social – material e não apenas formal - que visa estabelecer entre os indivíduos uma igualdade de fato que sua liberdade teórica é importante para assegurar. “Democracia pluralista, porque respeita a pluralidade de ideias, culturas e etnias e pressupõe assim o diálogo entre opiniões e pensamentos divergentes e possibilidade de convivência de formas de organização e interesses diferentes da sociedade”.
Não é de hoje que a sociedade brasileira está polarizada e dividida.  Como bem observa Wilson Ramos Filho, “houve uma bruta, enorme, estupenda politização da sociedade brasileira que passou a discutir política o tempo todo, nos salões de beleza e nas barbearias, nos bares de esquina e nos restaurantes mais sofisticados, nas salas de aula nas escolas públicas e privadas, nas faculdades e em milhares de grupos de Telegram, de WhatsApp, no Facebook, nas listas de e-mail”.
Contudo, o problema não é discutir, quando a discussão é respeitosa, desprovida de ofensas e agressões não há problema. Quando o respeito ao direito do outro e as diferenças não são ameaças, o diálogo é saudável. O problema está no autoritarismo, no ódio, no radicalismo. Como oberva Márcia Tiburi, “o autoritarismo da vida cotidiana é o conjunto de gestos tão fáceis de realizar quanto difíceis de entender. E ainda mais difíceis de conter. Em nossa época, crescem manifestações de preconceito racial, étnico, religioso e sexual, que pensávamos superadas. À direita e à esquerda, a partir de todos os credos, de todas as defesas que deveriam ser as mais justas e generosas”.
Letícia Sabatella, seu nome é democracia. Caberá a todos que amam a democracia e que respeitam o Estado democrático de direito defendê-la, defendê-la como o poeta Vinícius de Moraes manda defender o grande amor – plagiando o poetinha - defendê-la se sagrando cavalheiro e sendo de sua dama (democracia) por inteiro — seja lá como for. Fazendo do corpo uma morada onde clausure-se a mulher amada e postando-se de fora com uma espada — para viver um grande amor e, para sempre, defender a democracia.

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