Documentos
obtidos com exclusividade pelo Portal mostra envolvimento dos tucanos Aécio
Neves, José Serra, Geraldo Alckmin e o ex-presidente Fernando Henrique no
esquema de Furnas (Lava - Jato)
Por
Mayara Tridente - em Minas Gerais, para o Portal Metrópole
Quem pensa que o mensalão do
PSDB é o único esquema de corrupção do partido que está impune, se engana. A
sigla está envolvida em pelo menos outro escândalo de desvio de recursos que
não foi julgado até agora, apesar de a Polícia Federal ter atestado a
autenticidade do documento-chave para a denúncia.
O mensalão tucano,
recorde-se, ajudou a financiar a campanha de 1998, quando Fernando Henrique
Cardoso se reelegeu ao Planalto e Eduardo Azeredo, do PSDB, foi derrotado na
disputa pelo governo de Minas Gerais por Itamar Franco.
Nas eleições de 2002, os
tucanos promoveram outra forma de arrecadação de recursos para financiar suas
campanhas e as de seus aliados. O esquema previa o repasse de dinheiro por meio
de licitações superfaturadas da empresa Furnas Centrais Elétricas S.A.
Na ocasião, Aécio Neves era
candidato a governador de Minas, Geraldo Alckmin concorria em São Paulo – ambos
foram eleitos – e José Serra disputava com Lula o Planalto.
A chamada Lista de Furnas,
como ficou conhecida a estratégia de financiamento montada pelos tucanos,
rendeu milhões de reais para financiar campanhas. Denúncia da Procuradoria da
República no Estado do Rio de Janeiro classifica o esquema como criminoso.
O delator do mensalão
tucano, Nilton Monteiro, que também é o responsável pelo vazamento de
informações sobre a lista, informou à procuradora Andréa Bayão Pereira, autora
da ação do MPF, que os recursos eram controlados em um fundo (caixa 2).
A Lista de Furnas, documento
de cinco páginas assinado por Dimas Fabiano Toledo, à época diretor de
Planejamento, Engenharia e Construção de Furnas e operador do esquema, traz os
nomes de mais de 150 políticos beneficiários, assim como uma centena de
empresas financiadoras. No alto de cada folha se lê a advertência: confidencial.
“Esses recursos eram
controlados em um fundo formado com valores obtidos junto às diversas empresas
que mantinham contratos com Furnas” afirma Nilton Monteiro em seu depoimento à
procuradora. Ele explica que os empresários que queriam atuar em Furnas tinham
de contribuir com esse fundo. “Caso contrário não conseguiriam realizar nenhum
contrato na empresa estatal.”
O deputado estadual Rogério
Correia (PT/MG), primeiro a entregar uma cópia da Lista de Furnas à Polícia
Federal, conta como o esquema funcionava. Ele obteve o xerox do documento com o
delator do mensalão tucano. “Quando ele me passou a Lista de Furnas, eu tomei
um susto”, relata.
O laudo da Polícia Federal
atesta que o documento é autêntico. O pedido de perícia foi feito pelo
parlamentar. “Na época o Nilton Monteiro, e até hoje provavelmente, não ficou
satisfeito comigo. A intenção dele não era entregar [a lista] à Polícia
Federal. Ele tinha aquilo para fazer suas negociações com o lado de lá”, afirma
ao se referir às tentativas do delator de arrancar vantagens dos ex-aliados
tucanos.
Nilton Monteiro, que
trabalhou com o empresário Sérgio Naya, ex-deputado federal por Minas Gerais,
operava nos bastidores da política do estado e tinha intimidade com figuras
importantes do ninho tucano nas Alterosas.
Desvio
de milhões de reais
O governador de São Paulo,
Geraldo Alckmin, então candidato ao cargo, o ex-governador José Serra, que
disputava a Presidência da República, e o senador Aécio Neves, à época
candidato ao governo de Minas Gerais, foram os principais beneficiários do
esquema de corrupção milionário do PSDB.
Pela lista, Alckmin foi quem
mais recebeu recursos: R$9,3 milhões, R$3,8 milhões distribuídos no primeiro
turno e R$5,5 milhões repassados no segundo. Serra foi beneficiado com R$7
milhões, R$3,5 vieram no 1º turno e o restante no 2º. Aécio aparece como
beneficiário de R$5,5 milhões, quantia repassada em uma única parcela. Alckmin
e Aécio foram eleitos, Serra perdeu a eleição para o ex-presidente Luiz Inácio
Lula da Silva.
O governador do Rio de
Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB), e o deputado federal José Aníbal (PSDB), que
disputavam uma cadeira no Senado pelo Rio e por São Paulo, respectivamente,
receberam R$500 mil cada um.
Eduardo Azeredo (PSDB),
ex-governador de Minas e então candidato ao Senado, recebeu R$550 mil. Já o
candidato a outra vaga no Senado por Minas, Zezé Perrella (PSDB/MG), pai do
deputado estadual Gustavo Perrella (SDD/MG), dono da empresa proprietária do
helicóptero apreendido pela Polícia Federal, no Espírito Santo, com quase meia
tonelada de cocaína, foi beneficiado com R$350 mil.
Ao lado do nome de Zezé
Perrella e do montante repassado aparece a informação entre parênteses:
autorização de Aécio Neves. Esse é o único caso em toda a lista em que se
encontra esse tipo de anotação.
O prefeito do Rio, Eduardo
Paes (PSDB), candidato a deputado federal à época, foi beneficiário de R$250
mil. O ex-prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (PSD), que também disputava
uma cadeira na Câmara dos Deputados, recebeu R$100 mil.
Luiz Antônio Fleury Filho,
ex-governador de São Paulo, eleito na época deputado federal pelo PTB, também
se beneficiou do mesmo valor. Quantia equivalente foi entregue ao filho do
ex-delegado da Polícia Federal Romeu Tuma, o ex-deputado federal Robson Tuma
(PTB/SP), assim como ao ex-presidente da Força Sindical e ex-deputado federal
Luiz Antônio de Medeiros (PL/SP). Ao senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB/SP)
foram destinados R$50 mil.
Antônio Carlos Pannunzio,
eleito em 2012 prefeito de Sorocaba, aparece na lista como recebedor de R$100
mil para sua campanha a deputado federal.
O delator do “mensalão”
petista, o ex-deputado Roberto Jefferson (PTB/RJ), também foi beneficiado pelo
esquema de corrupção tucano. Recebeu R$75 mil. Valdemar Costa Neto, condenado
no “mensalão” petista, recebeu R$250 mil do PSDB por meio do desvio fraudulento
de recursos. O capitão do Exército e deputado federal pelo Rio de Janeiro, Jair
Bolsonaro (PP), crítico dos direitos humanos e árduo defensor da ditadura
militar, foi beneficiado com R$50 mil do esquema corrupto desencadeado pelos
tucanos. Andrea Neves, irmã do senador Aécio Neves, também recebeu R$695 mil, para
repassar a comitês e prefeitos do interior do Estado de Minas Gerais.
O deputado Rogério Correia
explica que além do laudo da Polícia Federal atestando a veracidade da Lista de
Furnas, há também o relatório da Procuradoria da República no Estado do Rio de
Janeiro, de janeiro de 2012, que chegou à mesma conclusão por outras vias.
Empreiteiras
e bancos
As construtoras Andrade
Gutierrez, Camargo Corrêa, Queiroz Galvão, OAS e Odebrecht são algumas das
empreiteiras que financiaram o esquema de corrupção do PSDB. O Banco do Brasil,
Bank Boston, Bradesco, Caixa Econômica Federal, Itaú, Opportunity e Rural são
algumas das instituições financeiras que, segundo a lista assinada por Dimas
Toledo, injetaram dinheiro no esquema.
A Alstom e a Siemens,
envolvidas mais recentemente no esquema de superfaturamento de trens do Metrô e
da CPTM comprados pelo governo tucano paulista, são citadas na lista. As
agências de publicidade de Marcos Valério, DNA e SMP&B, também
contribuíram.
Petrobras, Vale do Rio Doce,
CSN, Mitsubishi, Pirelli, Eletropaulo, Gerdau, Mendes Júnior Siderúrgica,
General Eletric e Cemig figuram entre a centena de empresas públicas e privadas
que aparecem como financiadoras.
Os fundos de previdência
privada dos funcionários da Petrobras, do Banco do Brasil e da Caixa Econômica
Federal, respectivamente, Petros, Previ e Funcef também são mencionados. A
Federação das Indústrias do Rio de Janeiro, Firjan, foi outra que destinou
recursos para o esquema tucano, de acordo com o documento.
O Tribunal de Contas da
União analisou contratos de Furnas e detectou direcionamento em favor de
determinadas empresas, além de superfaturamento nas licitações.
Uma auditoria da
Controladoria Geral da União, realizada em 2006, constatou falhas no processo
licitatório de Furnas: fraudes, desperdícios e abusos, além de projetos
antieconômicos e inadequados às necessidades da empresa.
Mesmo com todas as
evidências, o processo sobre a Lista de Furnas está parado, segundo o deputado
Rogério Correia.
O esquema operado por Dimas
Toledo o fazia tão poderoso que Aécio Neves, eleito governador de Minas em
2002, negociou com o então presidente Lula a permanência de Toledo na direção
de Furnas.
“O que deixou a bancada do
PT bastante insatisfeita, porque Dimas Toledo arquitetava tudo contra o PT,
especialmente no sul de Minas”, frisa o deputado Correia.
Curiosamente, o filho de
Dimas Toledo, Dimas Fabiano Toledo Jr., deputado estadual em Minas, aparece na
lista como tendo recebido R$250 mil.